quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

RD 350 - A Lendária Viúva Negra

Quem está por dentro do mundo das motos já conhece. Quem ainda está entrando vai ouvir. A RD chegou ao Brasil em 1974, dois anos antes da proibição da importação de veículos, e logo ficou conhecida como "viúva-negra" -- uma das mais perigosas aranhas venenosas -- em alusão a seu alto desempenho. Nas ruas era comum vê-la disputando "rachas de sinal" com a Honda CB 750, a "sete-galo" (galo é o animal correspondente ao número 50 no jogo do bicho), já que a CB 500, a Suzuki GT 380 e outras motos de média cilindrada não ofereciam potência à altura da RD.





A vantagem da Yamaha ficava ainda maior com o emprego de escapamentos dimensionados, que traziam maior potência, mas jogavam o torque máximo para um regime ainda mais alto. O ruído estridente do motor em aceleração total ainda deve estar na memória de muitos aficionados. Mas, além das limitações dos freios, suspensão e -- não raro -- de habilidade do piloto para tanto desempenho, a RD 350 impunha outros desafios.
Em 1976, já com as importações fechadas, a Yamaha aumentava sua cilindrada para 400 cm3, ampliando o curso dos pistões para 62 mm, e adotava freio traseiro a disco e rodas de alumínio. A potência subia pouco, para 40 cv a 7.000 rpm, mas o torque máximo passava a 4,2 m.kgf a 6.500 rpm, indicando uma "domesticação" do agressivo motor. Dois anos depois era adotada ignição eletrônica.

No Salão de Paris de 1979 a RD ganhava a sigla LC, de Liquid Cooled, arrefecida a líquido. Com ganho importante em potência (47 cv a 8.500 rpm) e confiabilidade, a cilindrada retornava aos 347 cm3 (64 x 54 mm), causando perda em torque (4,1 m.kgf a 8.000 rpm). Na parte ciclística, uma notável evolução: era a primeira Yamaha estradeira com Monocross, considerada a primeira suspensão traseira monoamortecida dos tempos modernos, com um amortecedor oleopneumático De Carbon em posição horizontal.

Os escapamentos cromados davam lugar a pretos e as rodas eram de alumínio, com cinco raios duplos. O freio dianteiro agora usava dois discos, mas na traseira retornava o tambor. Esse modelo evoluía, no Salão de Colônia de 1980, para uma versão com pequena carenagem de farol. Com apenas 143 kg e um motor de temperamento agressivo, era uma moto de média cilindrada capaz de dar trabalho até às quatro-cilindros de 750 cm3. Alcançava 180 km/h.





A distribuição de torque, porém, permanecia crítica: nada em baixas rotações e um "tiro" quando o ponteiro do conta-giros chegava a 6.000 rpm. Novos cilindros e carburação revista, já no ano seguinte, buscavam amenizar esse temperamento, mas uma solução mais eficaz era introduzida apenas em 1983: o YPVS, Yamaha Power Valve System ou sistema de válvula de potência Yamaha.

Similar ao adotado apenas dois anos antes na TZ 250 de competição, de comando mecânico, o YPVS "de rua" tinha controle eletrônico, uma sofisticada inovação. Seu princípio era restringir o escapamento dos gases queimados, como se essa janela dos cilindros (como se sabe, motores a dois tempos não possuem válvulas) tivesse dimensões variáveis. Em baixas rotações a válvula, acionada por um servomotor sob o comando de um microprocessador, fechava parte da passagem dos gases; em alta, liberava a exaustão.

Com o YPVS, a RD 350 LC chegava a 59 cv de potência a 9.000 rpm e a 4,8 m.kgf de torque a 8.500 rpm, este um ganho de 17% sobre o modelo anterior. A suspensão traseira evoluía para uma nova Monocross (não mais o sistema similar ao da DT 180 nacional), o freio traseiro voltava a ser a disco e os pneus eram mais largos, 90/90-18 na frente e 110/80-18 atrás, com rodas de três raios duplos.





Em 1985 a RD era toda remodelada na aparência, ganhando ar moderno e esportivo. A carenagem, ainda parcial, vinha fixada ao quadro, não mais movendo-se junto do guidão, assim como o painel e os retrovisores. Estes, por suas formas arredondadas, aqui ganhariam o apelido de "orelhas do Mickey". Farol e lanterna traseira eram retangulares, havia um pára-brisa maior, uma bela tampa do tanque de combustível e escapamentos pretos com silenciadores em tom de alumínio. Novo ganho de potência vinha no modelo 1986, que passava a 63 cv a 9.000 rpm.

A demora em sua nacionalização trouxe um efeito colateral: em vez da CB 450, a nova "viúva-negra" enfrentava na linha Honda a CBX 750F, lançada meses antes, que embora menos esportiva tinha quatro cilindros, bom torque em baixa rotação e 82 cv. Embora nossa RD andasse muito bem, com velocidade máxima de quase 200 km/h e aceleração de 0 a 100 km/h em cerca de 6 s, a "sete-galo" dos tempos modernos era ainda mais veloz e rápida, com 210 km/h e 5,5 s. Mas custava bem mais.

Uma tentativa de melhorar sua estabilidade foi feita, no mesmo modelo 1991, com os pneus Pirelli MT 75 no lugar do antigo Phantom. Desenvolvidos para equipar a nova 450 da Honda, em aro 17 pol, foram de certo modo adaptados ao aro 18 pol da Yamaha. Apesar de melhores que os antigos, sua aderência ainda não atendia às necessidades da 350.

Mas não foi só por isso que a "viúva-negra" deixou o mercado. Em 1993 as novas regras de produção na Zona Franca de Manaus passavam a considerar nacionais -- impondo alíquota de importação de apenas 4,8%, em vez de 40% -- motocicletas montadas com componentes estrangeiros (sistema CKD, completely knocked down, completamente desmontadas). O programa poderia ser mantido por 18 meses até a progressiva nacionalização dos produtos.





A RD 350 R de 1992, sua última versão: a Yamaha a trocou por modelos importados, montados em Manaus pelo sistema de incentivos implantado em 1993.